quarta-feira, 26 de agosto de 2020

A TRÁGICA HISTÓRIA DE UM PAÍS QUE, IGNORANDO A CIÊNCIA, NATURALIZOU A MORTE - Por Maik Oliveira

No dia 26 de fevereiro deste ano 2020, foi confirmado o primeiro caso do covid-19 no Brasil, tratava-se de um homem de 61 anos que acabava de chegar da Itália, 14 dias depois, também em São Paulo, confirmada a primeira morte pelo mesmo vírus, uma mulher de 57 anos. De lá pra cá os casos de infecção e morte foram se multiplicando de modo exponencial, hoje, dia 25 de agosto, soma-se quase exorbitantes 117 mil mortes, uma tragédia sem precedentes.

Ficávamos chocados, assombrados quando víamos e ouvíamos as notícias de que centenas de pessoas estavam morrendo na China, na Itália, na Espanha, amedrontados com o que poderia acontecer com o Brasil, emocionávamos ao ver as pessoas se socializando a partir de janelas, varandas, sacadas, tocando violino, cantando óperas, em abraços virtuais. 

Mas o covid-19 chegava à galope no Brasil e aqui, ele encontraria um terreno fértil, transformaria-se em mais um dos diversos cabos eleitorais municiados por fake news e descrédito. Em um país miseravelmente polarizado, alguns tentavam jogar luz sobre um inimigo invisível capaz de matar, isolar, instalar crises diversas, capitaneados pela ciência, esses logo foram taxados de disseminadores do medo, outros preferiam minimizar, não era para tanto, era muito pânico para pouco problema, esses, capitaneados pelo capitão disfarçado de presidente, logo pegaram a pecha de negativistas.

O vírus que ignora polarização política, despreparo para enfrentamento de crises, ignorância de um povo, foi chegando, se instalando, conhecendo e adorando o terreno, como um conquistador em terras desprotegidas, foi fazendo suas vítimas, primeiro infectando e em seguida, matando.

Os coveiros nunca trabalharam tanto, já não usavam enxadas, picaretes e pás, não dava tempo, era necessário escavadeiras. Cova individual? Privilégio de poucos, em alguns Estados as infames e brutais covas coletivas lembravam um cenário de guerra, uma guerra sim, brutal, insana, para médicos, médicas, enfermeiros, enfermeiras, auxiliares hospitalares, motoristas de ambulância, vítimas e familiares afetados pelo vírus pandêmico.

Para a politicagem sempre em voga no Brasil, uma oportunidade única de faturar alto, alguns assistiam de camarote o desenrolar da fatídica crise, queriam ver como o cúmulo do despreparo que ocupa a presidência ia se sair e ele, não decepcionou, fez o que um sujeito mediocrizado pela vida faria em tais circunstâncias, como Pilatos no julgamento de Cristo, lavou as mãos, primeiro ignorando o perigo, depois imputando culpa, as mortes e o desemprego recorde podiam ser jogadas nas costas dos governadores loucos, inimigos seus, esquerdopatas ou traidores que espalham o terror.

Quando seu Ministro da saúde o contrariou e afirmou a gravidade, ele o desautorizou, perseguiu, destituiu, tentou um outro que defendesse a cura a partir da perigosa e improvável cloroquina, e, apesar do visual zumbizento do novo ministro, este não atestou o discurso trumpista do presidente e jogou a toalha. No momento mais crítico da saúde do país dessa geração, o governo chega a escandalosos 100 dias sem um Ministro da saúde.

Entre "é uma gripezinha, "e daí", "não sou coveiro" e "vida que segue" as mortes foram se multiplicando assustadoramente e os políticos? Alguns, de olho no próximo pleito, disputam, através do discurso, a  simpatia dos moribundos eleitores, outros, talvez por acharem que a carreira política já foi pro brejo, superfaturam tudo que diz respeito ao pseudo combate ao vírus, são milhões e milhões de reais pra garantir o futuro de políticos e empresários inescrupulosos, aqueles que sempre estão dispostos a desembolsar somas exorbitantes para eleger os seus políticos de estimação, estes que, em troca, assumirão o desprezível compromisso de abrir com sorriso nos rostos os cofres públicos, desta vez, destrancados pelo tal "orçamento de guerra".

A imprensa foi mostrando a sua cara, evidenciando suas escolhas, parte se engalfinham no curralzinho, ops! No cercadinho do palácio do planalto para ouvir as bravatas do seu tosco mestre, jornalistas de última hora, com seus blogs e canais comprados, difundem e elogiam as falas fascistas e insensíveis de seu líder, outros, tentando dar um ar de seriedade e profissionalismo à profissão, questionam o comportamento e a falta de ação específica no combate ao inimigo invisível, esses, imediatamente são rechaçados e sufocados, ou pela agressão do capitão, ou pelas ameaças e até agressões físicas dos jornalistas sem diplomas acampados em barracas, alimentados à base de pão de sal e café preto nos gramados palacianos. É, a imprensa também se polarizou, nivelou-se por baixo.

5 mil, 10 mil, 20 mil vítimas, que horror! Alguém diz: "morrerá de 30 mil a 100 mil", lá vem o pessimista, sai pra lá! Dizem os negacionistas. 30.000, "eu não disse?! Mas vai ser mais!" Corta o microfone dele! A medicina clama: usem álcool em gel, lavem as mãos, #fiqueemcasa, nada de aglomeração, o comércio não pode funcionar, as escolas também não! O vírus já está no ar! Descrentes alucinados pelo neoliberalismo, vendo os lucros descerem a ladeira, não demoram a responder: Loucos! Vão falir o país, não passará de 7.000 mortes e somente aqueles velhinhos doentes, a pandemia não passa de 3 meses!

Nunca a Ciência foi tão depreciada e hostilizada. Nada de novidade em um país de desinformados, ignorantizados e cegos para a realidade. Terra fértil e com adubos de excelente qualidade para um vírus que se alimenta de pessoas néscias, multidões de desnorteados, desorientados. As mortes que em uma semana eram centenas, na outra já eram milhares e aconteceu o pior.

Naturalizamos a morte! De repente, aquele povo chocado com as centenas de mortes no exterior e que pavorosamente assistia nos telejornais as imagens de UTIs lotadas, ambulâncias em frenesi, covas e covas sendo abertas, falta de caixões para sepultamentos, passou a menosprezar os fatos, não dar mais audiência pros canais de notícias, os portais já não estampam em seus cabeçalhos chamadas que informam o número de mortes, antes uma rotina e que hoje, 25 de agosto, continua superando a trágica marca de mil, hoje a principal notícia é o cancelamento de uma sentença do ex juiz parcial Moro, ora, vejam só!

Parece não chocar mais, o Covid-19 tornou-se uma espécie de compatriota, ele está entre nós, abrasileirou-se, faz parte do nosso dia a dia, das nossas idas e vindas aos shoppings, aos mercados, às lojas, às festinhas de aniversários, nossos encontros casuais e sociais. É, ele continua por aí, infectando, matando e milhares de nós, com a sensação de que, se me pegar, pegou, se me matar, matou, se não, tá de boa, se eu for assintomático, melhor ainda. Ah! Afinal, não é um vírus de merda que vai me fazer voltar a viver em uma comunidade nuclear, quando já me individualizei e me autossuficientizei, quem é da vida é da morte, a vacina já tem na Rússia, logo, logo, estará aqui e se eu não morrer, viverei! Kkkkkkkkkkkkk...toca a vida!

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