sexta-feira, 21 de setembro de 2018

POR QUE BOLSONARO É O BEZERRO DE OURO DOS EVANGÉLICOS BRASILEIROS?

Já faz algum tempo que quis escrever um texto sobre a turbulenta batalha política pela presidência que recaiu sobre o Brasil, sobretudo nesse mês de setembro e que, provavelmente, tende a ficar mais crítica nos próximos dias, isso sem falar no segundo turno, com um processo ainda mais polarizado.

O que chama a atenção é a participação mais do que ativa do segmento evangélico nessa edição, não que esteja vetado ao segmento essa participação, muito pelo contrário, mas é que, na recente história da nossa democracia,
nunca foi assim tão ululante. Como explicar tamanha efetividade?

Pois bem, já é mais do que sabido, pelo menos em boa parte dos evangélicos, a sua tendência de voto. Obviamente que dizer, "boa parte", não quer dizer maioria ou minoria, pois não se sabe ao certo qual o percentual de evangélicos que votará em Bolsonaro nessas eleições.

Porém, dado a participação ativa nas redes sociais, nos debates, acusações, xingamentos, é isso mesmo, até nisso eles embarcaram, fica claro que a participação não será pequena, mas, e a razão da escolha?

Quando analisamos a figura do candidato, seu discurso, o que representa, para quem aprendeu os valores que os evangélicos defendem, fica meio que sem saber as razões, em muitos dá um nó, pois de fato, é difícil de entender, mas não impossível.

Bolsonaro representa o voto da revolta, daqueles que já não enxergam mais no discurso político, um caminho para revitalizar um país às margens do desespero, ressalta-se aqui, o problema da corrupção, plano de fundo para os demais percalços que a sociedade brasileira vive: violência, desemprego, educação de má qualidade, juros extravagantes, injustiça social, entre tantos outros flagelos que tomam conta de cada canto do país.

O povo brasileiro se mostra cansado, desiludido, crê que é necessário uma sacudida nos governantes, um "chega pra lá" em quem lá esteve ou está e, uma tentativa do que chamam de "algo novo" que possa bater de frente com a promiscuidade política e social que tomou conta da nação.

Bolsonaro e seus correligionários entenderam isso, perceberam que um discurso precisava ser construído para alcançar esses corações aflitos, afinal, em sua maioria, o eleitor brasileiro, longe de ter como característica a crítica sensível e racional, navega nas ondas da passionalidade, estão mais adaptados ao ouvir do que ao pensar, aliás esse é um problema humano, temos, em geral, preguiça de pensar, estudar, pesquisar.

Talvez, um das razões da internet virar uma vedete, o Google, a "biblioteca" mais visitada do mundo e o fake news a ferramenta de mídia mais eficaz,  afinal, pra quê ler, estudar, pesquisar, basta um "Ctrl C" e um "Ctrl V" e a questão é resolvida. Então, nesse contexto, viram com maestria, que não precisavam apresentar um projeto à nação, não tinham que se preocupar com economia, educação, emprego, justiça social. O discurso só precisava de um viés, o viés moral, um moralismo tosco, imoral e, falando em moral, quem se coloca como defensor de uma conduta pautada em preceitos moralistas como atributo humano para herdar a vida eterna? O evangélico! Ainda que sabe, a graça de Deus é a porta mais eficaz.

O evangélico (não todos, graças a Deus!) se viu representado em Bolsonaro, enxergou nele um arauto desse modo puritano de ver e interpretar o mundo. Lógico que o referido representante não é nada disso, basta uma breve pesquisa sobre sua vida pregressa pra saber que está longe da vida moral sonhada pelo povo evangélico e nem mesmo evangélicos, a despeito do que ensina a sua religião, são, em grande medida, exemplos a serem seguidos, afinal, são humanos e como humanos, falhos.

Evangélicos viram em Bolsonaro a contrafação daqueles candidatos diabólicos que defendem gays, lésbicas, que querem um estado laico, onde não somente o cristianismo tenha espaço, mas também as religiões de matrizes africanas, o espiritismo, os ateus, os sem religião, enfim, um estado de todos e para todas.

O evangélico é, antes de mais nada, defensor do lema "feliz é a nação cujo Deus é o Senhor". Mas, alguns entendem que, para isso, todos os demais precisam ser convertidos ao cristianismo e se não quiserem, que sejam banidos da face da terra, de preferência pela maldição do Senhor, se não, se possível, apedrejados como filhos do Diabo. Esquecem que, no contexto de suas crenças, o Deus que dizem seguir, também é criador de todas as criaturas, não faz distinção, que a todos ama e por todos deu a vida.

Bolsonaro então, se tornou uma espécie de fetiche dos evangélicos. O objeto político e espiritual que pensam ser capaz de transformar a nação no paraíso evangélico e eles têm a anuência de líderes que "dão a cara à tapa", cônscios de que se tudo der errado, podem jogar a culpa mais uma vez no Diabo (o que seria de determinados lideres evangélicos não fosse o Diabo?) e seus representantes e serão perdoados pelos seus seguidores, vão para a internet, mídia em geral e vociferam, conclamando à membresia à algo que já se assemelha a uma espécie de "cruzada" contra os pecadores.

Aparelham então, suas instituições religiosas com seus próprios anseios, seus desejos, seus mais obscuros desejos e conluios,e o povo, ou boa parte deles, como ovelhas indo ao matadouro, seguem seus lideres, afinal, são os "ungidos do Senhor" ordenando.

Esse egoísmo evangélico causa uma cegueira infame pois, ao centralizar sua fé para um país melhor em um fetiche, claramente antagônico ao que acredita e defende, não consegue enxergar o óbvio do que é a função básica da política: governar para todos e a todos sem distinção, como aponta Hannah Arendt,  "política baseia-se no fato da pluralidade dos homens e esta deve tutelar o convívio dos diferentes, não dos iguais".

Evangélicos nesse contexto, não enxergam o direito, o livre-arbítrio, o outro, não aceitam o diferente, não respeitam a crença ou a descrença alheia e o pior, acreditam mesmo, como cegos caminhando em direção do precipício que o fetiche antagônico que colocaram no altar de Deus, será capaz de dar a eles, a glória.

Pois é, esse tipo de evangélico, desconhece Deus e o seu amor. Bolsonaro é a prova contundente de que, boa parte do povo evangélico escolhe seus ídolos pela força do egoísmo.

É a história se repetindo. No deserto, rumo à terra prometida, o fetiche foi um bezerro de ouro construído com o que sobrou do vil metal trazido do Egito. No Brasil ele é chamado de mito, empunha uma arma e discrimina, faz apologia à violência, odeia minorias, menospreza mulheres, apoia e defende assassinos confessos, desconhece a história, menospreza o provo de África, abertamente propaga apoio incondicional a quem oprime.

Evangélicos, como dão trabalho ao Deus que dizem adorar, haja misericórdia!

sexta-feira, 25 de maio de 2018

CRISE DOS COMBUSTÍVEIS: SUA ORIGEM, SUA RAZÃO, SEUS PORQUÊS

Em relação à Greve dos Caminhoneiros, vamos colocar assim, com letras maiúsculas, pois entendo que esse não é um evento comum. Nele há muito o que ponderar.

A Petrobrás, estatal mais importante do Brasil, é aquela mesma empresa que foi tomada pela politicagem, sim, pois não é uma estatal qualquer, trata-se de uma que movimenta dezenas e mais dezenas de bilhões de dólares anualmente.

Para que tenhamos ideia mais precisa do que representa a Petrobrás economicamente, em 2010 a empresa efetuou  a maior capitalização em capital aberto da história no mundo, 72,8 bilhões de dólares, antes dela, a Nippon com 36, 8 bilhões era a detentora do recorde.

Pois bem, com tanto dinheiro circulando abertamente, sendo ela uma estatal em um país reconhecidamente corrupto em seus diversos setores, foi natural que os olhares dos gatunos vampirescos crescessem em sua direção, sem querer ofender os pequenos felinos domésticos.

A Petrobrás então foi cooptada para patrocinar e bancar grande parte do desvio de dinheiro público que não era pouco, a outra parte provinha de superfaturamentos, desvios de verbas já destinadas para obras estruturais, para a saúde, educação, segurança e por ai vai.

A ganância foi tão grande que segundo o Tribunal de Contas da União - TCU, o rombo chegou a 10% do faturamento anual da Petrobrás.

Bom você pode pensar, 10% é pouco, não quebra uma empresa que tem uma liquidez altíssima pois oferece um produto de extrema necessidade, o combustível, é, pode ser, mas, somando a esses desvios estão as más aplicações e, sendo ela uma empresa com papéis cotados nas bolsas de valores mundo à fora, viu ruir sua credibilidade e como consequência, seus títulos perderem valor de modo vertical.

Para se ter uma ideia, somente em 2014, com o impeachment, a Petrobrás no geral, chegou a contabilizar um prejuízo de 44, 3 bilhões de dólares. Para uma empresa com cotas em bolsas de valores isso é surreal.

Com tanto dinheiro saindo pelo ralo e com a credibilidade abalada, a maior empresa do Brasil se viu em situação de bancarrota, recuperar o dinheiro perdido e, principalmente, a confiança de seus investidores deveria encabeçar a sua pauta, era óbvio que o consumidor iria pagar o pato como sempre foi a dinâmica do país, mas como fazer isso sem causar revoltas na população, qual argumento usar para o aumento assombroso nos preços finais dos combustíveis?

A resposta não demorou, havia um caminho, indexar o valor dos combustíveis ao dólar, isso daria a Petrobrás, um argumento plausível à população, afinal, o preço do produto é reverberado mundialmente e, sendo assim, explica-se o aumento no país.

É óbvio que a previsão de aumento do dólar já estava sendo monitorada com as novas políticas previstas para o governo Trump, assim, cinco meses após Temer tomar o poder, em outubro de 2016, a Petrobrás anuncia sua nova composição de preços dos combustíveis tendo o dólar como um dos seus principais reguladores, adotando assim, a famosa política do livre mercado, dando vez ao que acontece com o mercado internacional, o tipo de política adorado e venerado pelos capitalistas, aqueles que nunca experimentaram e nem desejam conhecer o que é ser pobre, viver desprovido, em muitos casos, até do que é básico.

É bom lembrar que entre 2013 e 2014 o governo Dilma interveio no aumento dos combustíveis, na ocasião a então presidente da estatal, Graça Foster, foi duramente criticada pela grande mídia pois acreditavam-se que atender a um pedido presidencial poderia causar grandes prejuízos à empresa e aos seus acionistas, desses últimos, milhares são norte americanos preocupados em perder seus preciosos dólares com a desvalorização da estatal brasileira e já pressionavam a Petrobrás para mudar suas políticas de preços, no entanto, o governo do PT à época, bateu o pé em aceitar que o mercado internacional fosse parte regulatório dos seus preços de combustíveis.

Esse é um resumo da parte econômica do imbróglio, anexado a isso, está a questão política, essa talvez, a mais emblemática das questões, tendo em vista que escancara o "governo Temer" como aquele que articula suas investidas políticas, ensaia seus discursos e tem coragem para apresentar sem escrúpulos suas cartas no meio político, mas se mostra incapaz de lidar com qualquer crise, desde o desabamento de um prédio com a clara incompetência de sua assessoria por achar que seria aplaudido só por comparecer e fazer alguma promessa até a maior crise do governo, a "Crise dos combustíveis", onde se encontra perdido, lançando mão de discursos e ações estéreis e é simplesmente ignorado pela categoria que está em greve, os caminhoneiros.

Aqui mora o perigo, um governo que não se garante diante de uma greve que não vêm do povo comum, pois não é uma demanda política de ações generalizadas, ou seja, a Greve dos Caminhoneiros não é uma pauta que contempla o povo como um todo, muito embora afete a todos, a greve parte de quem não quer diretamente pagar a conta do rombo da Petrobrás, caminhoneiros independentes e empresas de transportes em geral, tanto que estão unidos, é uma greve articulada, pensada, e consciente do estrago que pode causar, politicamente e economicamente.

Nessa demanda se junta o povo comum, ou melhor, aqueles antes "classe C" e que depois dos governos populistas do PT, passaram a ser, em alguma medida, consumidores. Conseguiram financiar a casa própria com garagem ou estacionamento, tomar empréstimos bancários e com um esforço a mais, compram um carrinho 1.0 para por na garagem ou parar na porta de casa.

Esses adoram sua conquista, afinal, andar motorizado faz muita diferença, voltar a andar a pé é a última opção, mas com o litro de gasolina a R$5,00, quem aguenta? Um absurdo! Eis que ali na BR, os caminhoneiros estão parados, querem pagar menos pelo diesel, juntou-se então a fome com a vontade de comer, surge a #somostodoscaminhoneiros, mentira pura!

Querem mesmo é poder continuar a andar de carro, poder pagar menos por isso é o objetivo e se os caminhoneiros estão chamando a atenção do governo, vamos nos solidarizar, levar cafezinho, almoço, bolo de aipim, suco de acerola e maracujá, nesta época do ano, um licorzinho cai bem e apoio, muito apoio.

Tudo que as empresas queriam e o governo abominava, mas está acontecendo e se o problema saiu da esfera econômica para a esfera política, o poder então está em jogo, e quem não quer poder? A turma do "corre pro abafa" não deixaria passar a oportunidade, um governo fraco, um segmento da sociedade em revolta e o povo em perigo é a receita perfeita para que a turma do ufanismo "moral e bons costumes" diga que isso não está certo, é preciso que haja intervenção e apregoam por todo o canto que "o povo quer intervenção".

Os generais que de repente e gradativamente voltam a ser para alguns babacas, os titãs da política brasileira, ao ver uma parte desavisada da população clamarem seus nomes já colocam a barba de molho e entram com o discurso, ousam questionar uma ordem de um governo banana, afinal quem no governo ilegítimo vai bater de frente? Querem mesmo é o "deixa acontecer naturalmente".

Bom, pra terminar, por tudo isso descrito, é que essa não é uma luta daquele povo chato que veste vermelho e que são chamados de contra-hegemônicos, a diferença é que o povo chato que veste vermelho é em grande medida composto por socialistas e greve de combustíveis tendo como plano de fundo uma estatal é inconcebível no socialismo, é greve de hegemônicos, a pauta do engajamento político e social segue em outra direção, os acontecimentos de então é pra assistir de camarote!

sexta-feira, 2 de março de 2018

REFÉNS DO MEDO EM UM ESTADO MORALMENTE FALIDO


Hoje, sexta-feira, dia 02 de março de 2018, por conta de compromissos que ultrapassaram meu costumeiro horário de ir pra casa, para a refeição do meio dia, não pude levar meu filho de dois anos e meio para a escolinha. Minha esposa  ficou na incumbência desse serviço. Já faz alguns meses que comprei um carro e o trajeto tem sido feito com ele, mas dessa vez, os dois, esposa e filho, precisaram ir a pé, são poucos quarteirões, diria que o percurso não passa de 500 metros.

Era por volta de 13:30, quando dois elementos (é sempre assim) em uma moto azul, escondendo-se na covardia, quase sempre de capacete, uma vez que falta-lhes coragem para assumir sua condição amoral, puxou uma arma e "deu voz de assalto" à minha esposa e filho. Pediram o celular, mas como não estava com ela, puxaram a pequena mochila colorida da criança, abriram e bagunçaram as coisas do menino, na certa sem acreditar que o objeto "tão valioso" a porcaria de um celular que, para eles justificava tamanha insanidade, não estava com ela.

A criança, atônita, sem entender os "porquês" de tudo aquilo, como se fosse possível de entender até para nós adultos, perguntava à mãe, quem poderiam ser aqueles homens, agoniados, nervosos, com voz de comando e ameaças, o ronco de uma moto azul, que ameaçava a todo instante sair em disparada em seu ouvido, aparecia como algo que ele nunca tinha visto e ouvido, situações que o deixaram assustado, com olhos arregalados e marejados.

Não achando o celular, um deles, frustrado com o insucesso do roubo, pediu ao comparsa para deixar "ela levar o moleque pra escola", o meliante, no entanto, viu que ela estava com um brinco e deu o comando: "então me passa esses brincos ai, vai! Ligeiro!". Os bens, de pouco valor, eram apenas bijuterias simples, o prejuízo maior é a sensação de ser roubado, furtado, especialmente em seu direito de ir e vir com segurança, a sensação de que levar o seu filho para a escola em uma cidade como Itabuna é aventurar-se, arriscar a vida de si mesma ou de seu filho.

Eu saia do meu compromisso, mais ou menos no mesmo horário que estava ocorrendo o roubo, passei em frente à Igreja Santa Rita de Cássia, e ali estava uma viatura parada, cinco policiais, armados, patrulhando o nada, navegando na internet por meio de celulares, rindo das piadas que viam nas redes sociais. Respeito o trabalho da polícia, acho que, na condição de elo fraco, o cidadão precisa do braço forte do Estado, o trabalho policial, para ver garantidos os seus direitos primários, aliás essa é a função e o dever do Estado, para o qual o cidadão abriu mão do seu direito de liberdade plena e deu plenos poderes ao Estado a fim de que este, garanta o seu direito à propriedade e dentre essas propriedades está também a própria vida. Não é esta a lógica da sociedade do contrato social?

Acontece que, no Brasil, vivenciamos a realidade de um Estado falido, que já não dá conta da sua obrigação, do seu dever, que não consegue, ou por incompetência, ou por interesses espúrios, ou mesmo por falta de iniciativa, controlar o avanço da criminalidade, da violência que se apresenta de todas as maneiras possíveis, visíveis e invisíveis, perto, longe ou em suas entranhas. O cidadão e cidadã comuns, o trabalhador e a trabalhadora, pais e mães de família, se sentem aprisionados, vítimas da generalização do medo, da falta de segurança, da sensação de impunidade que cerca e toma conta das mentes de pessoas mal intencionadas, egoístas, para os quais não existem princípios como: moral, respeito, compaixão.

O povo de bem de Itabuna, como na maioria das cidades brasileiras são reféns do medo, já não consegue afirmar se voltará para casa são e salvo, ou mesmo se dentro de casa, conseguirá se safar dos tiroteios amiúdes em todos os cantos da cidade, em todos os bairros, desde as partes mais longínquas até as mais próximas do centro.

Outro dia, quando lavava o tanque de casa, encontrei uma bala calibre 38 que perfurou a tampa e só não furou o tanque por conta do volume de água. Fiquei pensando: e se fosse agora que estou aqui, ou mesmo se fosse em uma dia que eu estivesse com a família aqui?

O apelo que fica, é aquele que já é enfadonho, que já parece um apito mudo, que os responsáveis por colocar ordem na vida pública, sejam realmente capazes, primeiro de ordenar a si mesmos e depois, através de medidas adequadas e eficientes, mostrar ao cidadão que é possível confiar no Estado, afinal, a quem recorrer quando não podemos nos armar e como no "estado de natureza", agir livremente no modo "quem tiver a unha maior que suba na parede" ou mesmo como no Talião "olho por olho, dente por dente?". 

sábado, 29 de abril de 2017

POLÍTICA BRASILEIRA - A VERDADE DOS FATOS

Pessoas no meu blog, vamos situar a “brasileirada” agora, pois tem muita gente perdida nesse mar infinito de informações, na maioria das vezes partidária e destituída de uma visão global e isenta do que acontece de fato na política brasileira.

Ai fica aquela celeuma, "Volta PT x Fora Temer", "Fica Temer x Lula 2018",  "Fora PT x Viva Aécio", "detona o detonável PSDB", "A esquerda é boa x A direita é nefasta", "Vem aí o Bolsonaro", tem ainda a guerra declarada “coxinhas” x “mortadelas” e o que percebo? Raramente se vê alguém fazer uma análise fria e verdadeira dos fatos, visto que fazer isso, seria ter que admitir que o seu lado também é podre, tem culpa no cartório e como o “serumaninho” é um bicho orgulhoso do carái, prefere pagar o mico de ficar tentando vender peixe podre. Eita como tem gente nesse barco, muita gente com arcabouço e pedigree pra não entrar nessa, mas se de gaiato ou não, dependendo dos seus interesses, estão lá, fazer o que?! 

Eu prefiro observar e dar minha opinião com convicção, considerando que, com a formação que tenho, não posso errar de modo tão barato e, nesse mar de informações, nos últimos dias, vi apenas dois comentários que são para mim muito assertivos e relevantes, que vale à pena ler para pensar e que me renovaram a esperança de que tem gente vendo as coisas com mais clareza. 

Um deles, escrito pelo sociólogo Marcos Augusto de Castro Peres-UESC, que declarou: “Não se iludam, a esquerda e CIA Ltda estão longe de ser uma alternativa política melhor, são só o outro lado da mesma sujeira que se chama política!”. Concordei com ele e comentei que seria patético pensar ao contrário,  ainda que nossos sonhos, ideais e filosofia queiram uma esquerda limpa, comprometida com a ética e a boa política, infelizmente, não é o que se tem no Brasil.Parte superior do formulário

Outra declaração foi feita por Maurício Ricardo, sim, aquele famoso chargista, ele postou um vídeo que foi compartilhado por meu amigo, o matemático Jonathas Silva Pitanga. De lá, extrai o seguinte comentário: 

“Eleitos com dinheiro do “caixa 2” Dilma e seu vice, o Temer, são ilegítimos. Aécio seria ilegítimo se tivesse sido eleito. O Senado e a Câmara inteira devem no mínimo estar sob suspeição. Sobra até para o Supremo que tem juízes indicados por essa gente. Aliás, quem tá acompanhando as investigações da Lava Jato de perto, está vendo o lixo que é a justiça. Ela é lenta, ela pode ser parcial, ela pensa no próprio umbigo e faz qualquer coisa quando vão tentar mexer nos supersalários, enfim não faz justiça, as nossas instituições estão no fundo do poço”.

Por fim ele ainda arremata: "não é uma questão de esquerda e nem de direita, infelizmente nosso povo ainda não amadureceu pra isso”.

Observando assim, com um olhar isento, o Brasil precisa de uma reforma política já, precisamos repensar o modo como fazemos política no Brasil e quando digo isso, estou pensando nas inúmeras mudanças que precisamos fazer nesse sentido, como por exemplo: os governos de coalização, o financiamento de campanha, as verbas partidárias, a relação político/privado, esse último então, maior vetor da corrupção no país, entre outros.

Mas vejam, dentre os assuntos elementares que podem, de fato, promover mudanças, esse é o menos discutido, é a bandeira que menos se levanta, nem mesmo entre os intelectuais que estão ai com a bandeira vermelha levantada, e qual a razão?

Isso implicaria em mudanças substanciais no seu modus vivendi em benefício do todo, e ninguém quer isso, alías, arrisco dizer que para muitos deles, se tiver que ter essas mudanças assim tão profundas, preferem os status quo ou a volta do que sempre combateram.

Acredito que esse seria um motivo real para, como povo, sairmos às ruas e aí sim, fazer história nesse país que não pára de dar vexame.

terça-feira, 13 de dezembro de 2016

A TEOLOGIA DOS CONTRASTES

Na última sexta-feira (09) por um acordo com os familiares, precisei abrir mão do último dia do IX SECISO - Seminário de Ciências Sociais da UESC - para conduzi-los até o povoado de Capoeiruçu-BA onde aconteceria a formatura do cunhado que concluía o curso de teologia no IAENE, Instituto Adventista de Ensino do Nordeste.

Capoeiruçu é um pequeno vilarejo às margens da BR101, cerca de 300km de Itabuna, próximo a histórica cidade de Cachoeira. O vilarejo se desenvolveu (se é que podemos usar essa palavra para um lugar tão básico) ao redor da atual Faculdade Adventista, esta sim, uma instituição que cresce em bom ritmo à medida que a mesma aumenta o leque de cursos oferecidos, que diga-se de passagem, não são nada baratos.  Atualmente são 11 os cursos oferecidos, o mais barato deles é o Secretariado Executivo cuja mensalidade não sai por menos de R$443,70 já com o desconto de 10% segundo o site www.adventista.edu.br. O curso mais caro é o de Odontologia que custa cerca de R$2.470,00 segundo o mesmo site.

A faculdade está construída em uma enorme área - seu terreno é certamente maior que toda a área habitada do povoado - é a joia do adventismo no nordeste e uma das mais importantes instituições de ensino adventista no Brasil, ali está instalado o SALT - Seminário Adventista Latino Americano. O sonho de muitas famílias adventistas é enviar para lá seus filhos, sempre filhos e nunca filhas, já que quase (quase é generosidade) não há espaço para o trabalho de mulheres no que é denominado de "O ministério" e com isso querem a alegria de poder ter entre seus familiares um "pastor adventista" um sujeito que posteriormente poderá compor a oligarquia de uma comunidade que se desenvolve com as características próprias de uma teocracia - tema para outras conversas.

A formatura é algo especial e não poderia deixar de ser. A membresia se desloca de diversas localidades do Brasil para assistir a festa que chega a durar 3 dias. Em um templo com uma estrutura esquisita (pelo menos passa longe de parecer um templo e sim um centro de convenções) no centro do campus, com capacidade para aproximadamente 2 mil pessoas, estas se apertam para ver filhos, primos, sobrinhos, receberem o laurel de pastor, algo que não garante o ingresso imediato na "obra", precisam aguardar "o chamado" que ocorre depois de um intenso e as vezes subjetivo processo de escolha, que vai desde a idade, a situação conjugal, histórico na igreja de origem, capacidade de liderança, retórica, amizades e contatos dentro da instituição. Depois desse processo, o candidato a pastor recebe o desafio de assumir um "distrito pastoral" ali, ele deve mostrar serviços em duas frentes básicas, aumentar o número de fiéis e a quantidade de dízimos arrecadados, após mostrar o sucesso esperado ele é "ordenado pastor" e aí sim, assume definitivamente o papel de líder espiritual da igreja.

Este é um breve relato de como ocorre o processo de "pastorialização" de um fiel da Igreja Adventista. Importante dizer que este não é um curso para qualquer pessoa, para ingressar ali, o indivíduo precisa primeiramente ser adventista, depois passar por um processo de análise comportamental ou ser indicado por um dos pastores líderes da igreja. Nesse sentido, a teologia adventista é exclusivista, fechada, e está a serviço somente das igrejas adventistas não sendo reaproveitada com facilidade (caso o chamado não ocorra) em outros segmentos da sociedade, dado seu caráter etnocentrista.


Pois bem, algo me chamou a atenção grandemente nesses 3 dias que passei em companhia de familiares naquele lugar quente e inóspito, onde quase nada se encontra, especialmente no sábado, quando quase todos os estabelecimentos comerciais são fechados pois não há clientes, por motivos óbvios. O que vi ali foi algo que nós sociólogos não conseguimos ver com naturalidade.


 Conduzido à casa que ficaríamos durante a nossa estadia, fiquei impressionado com a situação das moradias do lugar, a sensação era de que estávamos em um assentamento dos tempos de Antônio Conselheiro, acredito até que na Canudos de então, dado o contexto, a dignidade humana era mais respeitada. As "casas", doadas por um destacado empresário adventista baiano a mais de 25 anos, parecem nunca terem recebido sequer uma nova pintura. A chamada "Vila dos Teologandos" que recebe esse nome por conta de historicamente abrigar os alunos do curso de teologia, nada mais é do que um lugar abandonado, esquecido, ignorado. Somente duas das 30 casas do lugar tinham recebido uma reforma, as demais estavam às moscas, mergulhadas na escuridão do abandono.
Os estudantes que para ali vão, em sua maioria, tem origem humilde, eles não têm condição de pagar um aluguel nas poucas casas no vilarejo em melhores condições, construídas por empreendedores, em sua maioria adventistas, que aproveitam a presença da faculdade para alugar seus imóveis por nada menos que R$600,00.
Os adventistas humildes que sonharam e conseguiram ingressar na faculdade torcem para conseguirem uma dessas casas abandonadas e ainda assim pagarem cerca de R$300,00 para a instituição, sim, não é de graça, aliás, nada no IAENE é de graça, tudo tem seu preço, tudo requer uma contribuição. 

Para o pobre estudante de teologia pagar uma mensalidade de R$849,00 ele precisa ralar, dar a sua contribuição, a maioria aceita ser vendedor de livros da instituição Brasil à fora, durante todo o tempo de duração do curso, as suas férias são dedicadas ao trabalho sofrível denominado "colportagem" e precisam suar muito para conseguir atingir a meta, se isso não ocorrer, ficam em débito com a instituição, sendo "convidados" a abandonarem o curso por falta de pagamento.
Bom, você diria, mas tudo tem seu preço na vida! Sim, é verdade, mas sinceramente, não sei se o preço da dignidade é um preço justo. Aliás, o título desse texto, "A teologia dos contrastes" se deu quando fiz uma investida no campus do IAENE, lá onde tudo parece um lindo lugar, e é, de verdade. Quando visitamos a "Vila dos Pastores" o contraste é eloquente, não parecia que estávamos no vilarejozinho de Capoeiruçu no interior da Bahia, mas sim, em uma cidade americana, daquelas arrumadinhas que a gente vê nos filmes para adolescentes. Casas muito bem construídas, bem pintadas, a maioria com um ou dois carros importados na garagem, alguns jardins bem cuidados, um sonho para muitos estudantes de teologia que chegam ali oriundos das periferias miseráveis das cidades brasileiras, parece até que o contraste ali tão visível é uma espécie cruel de motivacional, do tipo "você pode ter isso aqui basta se entregar de corpo e alma ao nosso propósito".
Na entrada, logo após o portal de boas-vindas da faculdade tem uma placa onde se lê: "Quando você fere um irmão está ferindo Jesus", mais adiante outra que diz: "Quando você faz o bem a outra pessoa, faz o bem a si mesma". Não pude deixar de pensar de como o discurso religioso sempre foi usado ao longo da história para alienar e aprisionar as massas. Estando ali, observando atentamente o comportamento das pessoas, suas falas, os pontos de vistas acerca de si mesmos e do outro, a ideia frágil de irmandade e companheirismo, não é difícil perceber como o individualismo não poupa nem quem acredita que ser cristão pode ser sinônimo de servir. 


O discurso pode ser perfeito, mas a prática está longe de receber o "aprovado" do sagrado, do divino. Parado na entrada da faculdade, na sombra, depois de uma manhã quente entrevistando pessoas, observando o lugar quase ao meio dia, vi crianças saindo da igreja, algumas mães com filhos de colo, outras grávidas, idosos com passos trôpegos caminhando em direção aos seus lares e sob o sol intenso e escaldante do meio dia, via que "irmãos" passavam em seus carros refrigerados, alguns só com dois ou três passageiros, outros com somente um, e fiquei pensando, espera, mas não são irmãos? Não comungam da mesma fé? Que tal oferecer uma carona para um idoso, para uma mãe com uma criança de colo, para uma grávida? Eram tantos carros que acredito que se todos se desprendessem daria para levar boa parte dos irmãos de fé confortavelmente para suas casas que nem era assim tão longe.

No entanto, parece, o individualismo se sobrepõe à condição humana, à qualquer condição, até mesmo a de crentes, discípulos do Cristo que um dia disse: "Amai a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo". 

Basta observar que tal ausência de compaixão não está refletida somente entre os membros comuns, ela se estabelece com maior força ainda naqueles que ocupam posições de destaque, que recebem dos fieis humildes a legitimidade da liderança e como posso afirmar isso? Visitem o Instituto Adventista de Ensino, o IAENE, no vilarejozinho de Capoeiruçu - BA, hospede-se na "Vila dos Teologandos", assista um culto na igreja esquisita, em seguida, torça, torça muito para ser convidado para almoçar na casa de um pastor bonzinho e depois volte para a vilazinha de 30 casas dos teologandos a pé, no sol escaldante, certamente, com tristeza, você vai se lembrar que leu esse texto e vai se indignar, a menos que você seja um alienado adventista que pensa que cada um paga pelo mal que faz e que só te resta esperar pelos benefícios do Senhor na eternidade. 

Pois é, pois aqui, no plano terreno, os tais benefícios estão sob a tutela pastoral e eles, ao que parece, já sabem que destino dar ao "trazei todos os dízimos à casa do Senhor!"


quinta-feira, 20 de outubro de 2016

II Congresso Online CENTED. Administração, Ciências Sociais e Educação

Congresso Internacional CENTED online, aceitando trabalhos nas áreas de Educação, Administração e Ciências Sociais. Vale a pena participar.

"Desarrollo Organizacional:
Cultura, Educación y Gestión del Conocimiento"


CENTED está aceptando presentaciones de resúmenes para su primer Congreso Internacional sobre "Desarrollo Organizacional: Cultura, Educación y Gestión del Conocimiento," que se celebrará, totalmente en línea / ONLINE (en su totalidad a distancia por Internet), entre el 4 y el 6 de abril de 2017.

Visite a página para maiores informações.

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quinta-feira, 23 de junho de 2016

Lançamento do livro Kindle Digital "TRATADO DE UMA VIDA A DOIS"

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quarta-feira, 11 de maio de 2016

O DESGOVERNO EM ITABUNA

Avenida  Beira Rio em Itabuna - Gravura de Rafael Pita 
O município de Itabuna, situado na chamada Costa do Cacau, no sul da Bahia, vive um dos maiores dramas de sua história. Não somente no que concerne ao problema da falta de água ou fornecimento de água inadequada para consumo humano que não é exclusividade do município, muito embora a situação de Itabuna é absurda, mas, também, sofre pela falta de representatividade política, esse sim, o problema que pode agravar todos os problemas estruturais que já existem. 

Digo falta de representatividade política porque é possível dizer, que nunca na história dos quase 106 anos do município se viu um governo municipal tão inerte e tão incapaz de apresentar para a sociedade, ao menos, uma luz no fim do túnel. 

Neste primeiro texto, discutiremos o problema da Educação e da Segurança Pública, posteriormente poderemos discutir a questão da saúde, do poder legislativo do município que quase não existe, nem em fiscalizar, nem em apresentar projetos de melhoria da vida dos cidadãos. Não se vê, por exemplo, uma única ideia intervencionista por parte de vereadores em sua própria área eleitoral. Ou seja, é uma câmara municipal que praticamente não existe na cidade, aliás, existe no final do mês quando chegam os seus vencimentos. Ou alguém aí é capaz de dizer quem são os vereadores de Itabuna?

O município sofre com a escalada da violência, um problema que já se arrasta por anos. Sofre com problemas na educação quando os profissionais já durante alguns anos estão insatisfeitos com o tratamento dispensado à classe: atrasos repetitivos de salários; não pagamento de férias; acordos não cumpridos; isso sem falar nas condições de trabalho onde unidades escolares encontram-se em condições deploráveis. Nesse momento os professores estão de férias sem recebê-las e já ameaçam não retornar se o dinheiro não estiver na conta, justo, muito justo.

Obviamente que a questão da segurança pública não é necessariamente prerrogativa do município mas do Estado. No entanto, sem dúvida, cabe ao governante municipal trabalhar junto ao governo do Estado para apresentar uma solução para a sociedade. O que não pode é continuar como está. É assustador o número de mortes de jovens de 19-24 anos. Segundo o Ministério da Justiça e o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, em 2014, a cidade chegou a liderar um ranking nacional de violência contra jovens que estão nessa faixa etária, é estarrecedor. Atualmente a situação não é muito diferente, pois até o início desse mês já se registravam 60 assassinatos no município. Alguém ai se sente seguro?

Quanto à educação fundamental, a parte que é da alçada do município, a cidade sente falta de um projeto adequado e responsável para gerir este setor tão importante da vida social. A sociedade não pode continuar assistindo de modo passivo o que ocorre no âmbito da educação municipal, é preciso cobrar do poder público um projeto eficaz que contemple uma gestão escolar que faça a diferença na pré escola e no Ensino Fundamental, basilares para a continuidade da socialização dos indivíduos. Se o poder público falha nesse aspecto os prejuízos serão irreparáveis para o futuro.

É preciso que os gestores municipais se libertem do pensamento retrógrado de que se pode colocar nas mãos de pessoas neófitas, questões tão importantes como Educação e Segurança Pública. A região, por exemplo, dispõe de profissionais preparados, com conhecimentos avançados em gestão escolar e segurança (Mestres, Doutores). Possui universidades que discutem em todo o tempo a problemática da educação e que podem estar  à disposição do município para discutir e encontrar a melhor maneira de melhorar a qualidade da educação ofertada, é uma saída que possui baixo custo e com toda certeza produzirá excelentes resultados. 

O grande problema da gestão pública continua sendo a visão amadora baseada nos favorecimentos políticos, isso nunca deu certo nem nunca dará. Não se pode abrir mão do conhecimento técnico, testado, sob pena de o corpo social pagar um preço muito alto pois a conta certamente virá. Os resultados estão aí para atestar o que estamos discutindo e não precisa ser expert para saber que há falta de compromisso com a qualidade dos serviços prestados ao povo.  

domingo, 24 de abril de 2016

O que há de comum entre Racismo e Orientalismo


(ARTIGO) DEPENDÊNCIA E DOMINAÇÃO
A manutenção da hegemonia


Marivaldo Oliveira da Silva (Maik Oliveira)
Licenciado em Ciencias Cociais - UESC
Pós graduando em Sociologia - UESC

RESUMO

As discussões sobre raça, origem, hegemonia, dominação, têm ocupado a mente de estudiosos que se debruçam em entender os porquês destes fatos. Neste trabalho, apresentamos sob a ótica de dois dos mais preeminentes estudiosos sobre a problemática racial e as relações entre ocidente e oriente, a saber, Carlos Moore e Edward W. Said respectivamente, como se dão essas relações a partir de um contexto histórico. Buscar entender como os grupos hegemônicos agem para continuar dando as cartas é importante para nos situar onde nos encontramos neste universo de discursos, onde o outro prefigura uma imagem construída a partir do desejo de supremacia. O negro e o oriental representam então, esse outro, cuja inferiorização (construída) servem para fortalecer a identidade dominadora. Culminando em um processo de hegemonia que se arrasta ao longo da história.

Palavras-Chave: Orientalismo. Racismo. Sociedade   

 INTRODUÇÃO
        As obras de Carlos Moore (2007) “Racismo e sociedade: novas bases epistemológicas para compreensão do racismo na história” e de Edward Said (1990), “Orientalismo: o Oriente como invenção do Ocidente” propõem um rompimento com a concepção equivocada ou intencional do “Outro”, que é tão difundida e massificada no ocidente. Isto porque, impregnou-se na sociedade ocidental, através da história, conceitos e ideias, que, segundo os autores acima mencionados, fogem grandemente do contexto histórico.
       Moore (2007) nos diz, que esta massificação, referente ao racismo, se dá a partir de uma lógica baseada, quase inteiramente no senso comum, de entender o racismo como algo relativamente recente, a partir da escravização do negro, a cerca de 500 anos. Este pesquisador, através de um embasamento histórico profundo, apresenta uma compreensão mais abrangente acerca do fenômeno em questão. Para o ele,  o racismo existe entre 3 e 4 mil anos e apresenta indícios claros que o mesmo surgiu há 1700 anos A.C. Se Partirmos do tempo atual, seus estudos, portanto, nos apontam para além do “marco zero” do surgimento das ideias racistas, após o surgimento da raça humana, antes de o conceito de raça ser assim compreendido, antes mesmo do negro se ver como negro pois, era o único povo a habitar o planeta, e isto nos remete a milhares de anos, passando pela saída dos humanos da África, aproximadamente 50 mil anos, chegando a lugares de climas mais frios onde, por processo de seleção natural, (cerca de 12 a 18 mil anos), surgem as raças leucodérmicas, pessoas de pele clara.
       Estas raças que não se conheciam, iniciam batalhas duradouras e violentas por recursos, uma vez que o espaço, agora ocupado, se mostrou pobres em itens importantes para a sobrevivência, é quando começam a despejar os negros em lutas desumanas. É neste momento da história que as raças se percebem distintas, basicamente não por diferenças biológicas, mas pelo que é perceptível, as diferenças fenotípicas. Segundo Moore (2007:49), é neste contexto que surge o conceito de raça.
       Já Edward Said (1990), apresenta uma percepção do “Outro” como que de forma construída, intencional. Discute as razões das ideias orientalistas, onde o ocidente observa o Oriente como uma espécie de oposição, onde o primeiro se autodefine superior a partir da imagem do segundo, tido como inferior.
        Muito embora este olhar sobre o Oriente fornecesse material para uma produção intelectual importante para a consolidação do que é e como se porta o Ocidente, o contrário não é verdadeiro, ou seja, da parte do Oriente não houve um “ocidentalismo”, uma produção intelectual que pudesse identificar nos próprios moldes, o ocidental em relação ao oriental. De modo que, segundo Said, toda essa produção intelectual, transformada em ciência, tem um objetivo bem definido: conhecer o outro para agredir, julgar e persistir na dominação e exploração. Concebe então o “Outro” não segundo “sua imagem e semelhança”, mas de o diferente, o oposto, o débil, o inferior, e completamente passível de dominação.
       Para o autor, o orientalismo adiantou-se em representar o Oriente e isto foi feito sem o consentimento dos orientais. A grande gama de conhecimento sobre o Oriente difundido no Ocidente, seus contornos, suas vocações, suas percepções religiosas e políticas, foi feito à margem do interesse daqueles que habitam àquela região do planeta. Como um grande conhecedor de literatura, Said faz uma análise profunda de variados escritores que ele chama de imaginativos, visto que a imersão desses intelectuais no mundo oriental é comprometida por pré-noções advindas de interesses políticos e econômicos da cultura hegemônica ocidental.
       O autor, portanto, apresenta o orientalismo como sendo uma perspectiva visionária do Ocidente em relação ao Oriente, sistematizada em um estudo regularizado, contendo concepções imperativas e preconceitos ideológicos que atingem a linguagem, a cultura, a religião e os modelos de organização política e social do povo oriental em comparação com os mesmos segmentos da sociedade ocidental. Nesta perspectiva, temos então, um sistema de representação intencional, que se encaixa perfeitamente nos interesses de forças políticas que mostram um Oriente enquadrado no modo de ver e interpretar o mundo do Ocidente, que foi, ao longo de séculos, massificado através da literatura, da mídia, do cinema e da política em geral na consciência ocidental.
      As obras aqui relacionadas fornecem boas bases para a interpretação e compreensão de acontecimentos contemporâneos aparentemente distintos, como as lutas dos Movimentos Negros no Brasil e o tão noticiado conflito entre palestinos e Israelitas no Oriente Médio. Distintos mas ao mesmo tempo semelhantes, visto que, em ambos os casos, é possível observar como o outro é decifrado a partir de interpretações, pré-noções e construções históricas que jogam a favor de apenas um lado. Uma realidade que vai se naturalizando ao longo do tempo e se torna a base de práticas políticas, sociais e culturais que dilaceram, ou simplesmente, ignoram o direito do outro existir com igualdade de condições e dignidade. 
      Destacamos neste trabalho uma notícia publicada no site jornaldocampus.usp.br no dia 10 de abril/2015, intitulada: “Movimento negro promove ações para discutir relações raciais na Universidade”, baseada em um vídeo publicado no canal Youtube, postado com o título: “A intolerância do “movimento negro” na USP”. Esta notícia discorre sobre a atuação do grupo “Ocupação Preta”, em uma aula de Micro Economia da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo - USP.
       Também destacamos o infindável conflito entre israelitas e palestinos que se iniciou no fim do século XIX com a ocupação da antiga Palestina, região que antes pertencia ao império Otomano. Nosso objetivo é, à luz dos escritos dos autores supracitados, entender em parte, tais acontecimentos. Em parte, pois compreendemos ser assuntos complexos e que naturalmente rende trabalhos acadêmicos também complexos, ricos em dados e explicações sobre diversas perspectivas. Mas aqui, pretendemos mostrar que esses acontecimentos têm algo em comum: como a imagem do outro foi construída e assim é mantida ao longo da história e, como esta mesma imagem construída é instrumento de perpetuação para um poder hegemônico que a todo custo inibe ações para a emancipação do outro, reprimindo, na clara intenção de manter o staus quo. 

QUANDO O RACISMO NEGA A SI MESMO: RESISTÊNCIA AOS ESFORÇOS DE MUDANÇA

       Na USP, o dia 16 de março de 2015, uma segunda-feira, foi marcado com um acontecimento que, posteriormente chamou a atenção da mídia, especialmente as mídias sociais online. Jovens negros, integrantes do grupo “Ocupação Preta”, adentraram em uma sala de aula da Faculdade de Economia daquela universidade, onde estava sendo ministradas aulas de Micro Economia e solicitou espaço para discutir ações afirmativas.
       No primeiro momento, um dos integrantes chama a atenção para o que é visível naquela sala e em tantas outras salas de aulas de universidades Brasil à fora, o fato de que a grande maioria dos que ali estavam não era de negros.
       No momento quando o representante inicia discussão sobre a proposta do Conselho Universitário, este é parcialmente interrompido pela professora que chama a atenção para a aula, que considera importante. O representante, no entanto, continua seu discurso, sugerindo que cada unidade da USP tenha a sua opinião sobre como deve ser a entrada alternativa para estudar naquela universidade. Uma luta que, segundo ele, já é travada pelos negros em torno de 20 anos, mas que é feito à portas fechadas, sem que mais pessoas diretamente interessadas tomem conhecimento.
       A proposta de levantar a discussão naquela aula é imediatamente rechaçada pela professora que convida os integrantes do movimento a continuar na sala prestando atenção ou que se retirem para que a aula tenha continuidade. A partir daí, inicia-se uma discussão entre a professora, um aluno da disciplina e outros integrantes do movimento, tendo os demais alunos como expectadores.
       Uma moça então questiona à professora: “então a sua aula é mais importante do que a questão racial?” A resposta não é ouvida, o que se ouve em seguida é um discurso pautado na meritocracia, do tipo “estuda e entra”, ou, “você estudou onde? Em escola de ensino privado?” Uma jovem negra questiona o interlocutor: “quando você for mulher e negra na periferia você me diga se é fácil entrar nesta universidade”. O estudante retruca: “ta bom, não precisa se vitimizar!” É a deixa para falas generalizadas sobre racismo, condições de igualdade, culminando com a fala acalorada de uma das integrantes, afirmando que a USP é uma universidade feita para brancos, uma “universidade branca”.
       Sem discutir se foi certo ou errado os jovens negros interromperem uma aula na USP para levantar seus questionamentos, este episódio nos remete a condição de observação do "outro" como encontramos em Moore (2007, p.33), quando o autor discute a tese de Jean Baechler fazendo referência ao “Outro Total” como alguém que “é de pele negra, de cabelos crespos, de feições “toscas” e habita, simbólica e concretamente, um continente distante, escuro e ameaçador”. Neste caso específico, o “Outro Total” é aquele cujas fronteiras são sociais, ele é diferente e distante do ponto de vista da convivência social e das oportunidades que lhe são conferidas ou a falta delas.
       Uma das perguntas dos integrantes do movimento ao aluno que dizia: “eu só quero ter aula de Micro Economia”, foi: “você quer saber como é ser negro?” Ele responde que não quer saber, que só queria ter a aula dele. Aparentemente, não interessava ao referido aluno saber o que é e como é “ser negro”, aliás, a pergunta está carregada de significados, nela está inserido todo um contexto histórico, que remete a compreensões distorcidas da realidade do negro, que desemboca em questões culturais, religiosas, políticas, que segundo Moore nem é tão recente como foi e tem sido propagado, mas, trata-se de uma construção que se inicia a partir do momento em que os povos se percebem diferentes, Moore (2007, p. 49) afirma que:

 “A pretensa “superioridade” genética que certas raças ostentariam sobre as outras, não passa de ser uma construção da consciência que, por razões ainda indeterminadas, originou-se em certas populações e em épocas que, logicamente, tiveram de ser posteriores ao período em que efetivamente acontecera a diferenciação racial dentro de uma humanidade até então consistentemente melanodérmica”.

       No episódio da USP, ao minimizar naquele momento a necessidade dos jovens negros em discutir a problemática da falta de oportunidades no que tange ao acesso naquela universidade, a professora se reveste do discurso imediatista, do tipo: “tudo bem, mas nesta aula não, preciso dar aula, mas vocês podem marcar outro horário”. Esta posição da discente foi interpretada como sendo uma desconsideração, ou mesmo uma manobra para que a discussão não aconteça. Foi para os jovens negros militantes ali presentes, um exemplo prático da falta de oportunidade e da diferenciação de raças que acontece ao longo da história. Ou seja, estampa-se diante deles um descaso que leva ao questionamento: “então a sua aula é mais importante que a questão racial?”
       Em uma das falas do estudante que questiona “a invasão” à sala de aula, há a afirmação de que estudou em escola privada e que seu pai, trabalhou muito para pagar seus estudos e ele estava ali por mérito. Exatamente o discurso contraposto pelo grupo militante que, segundo o seu manifesto, percebe o vestibular da USP como um filtro social e racial. Para eles, o vestibular da USP favorece exatamente filhos e filhas de famílias abastadas que têm condições de estudar em uma escola particular onde a qualidade da educação mostra-se superior a de escolas públicas e que, geralmente, é nestas últimas que se encontra a grande maioria de jovens negros e pardos oriundos de famílias que vivem em condições materiais inferiores às da população branca.
       A reportagem ainda informa que, segundo dados do IBGE (2010) o rendimento médio da população branca é de pouco mais de R$1.500,00, enquanto que da população negra, chega aproximadamente a metade disto, cerca de R$830,00. Neste ponto, é possível perceber o que Moore (2007) denomina de “sistema de poder total”, um sistema que não se restringe a uma ou outra esfera das relações humanas, mas efetivamente em todas aquelas esferas que são a base da construção da sociedade, vejamos:

Sistema de poder total, cujas formas de dominação e de opressão conseguem abranger todas as esferas estruturantes da vida social, o racismo goza de uma extraordinária transversalidade. Concretamente, o racismo implica a seguinte situação: a supremacia total de um segmento humano que se autodefine como raça sobre outro segmento humano. Essa supremacia se expressa por meio de uma hegemonia irrestrita tanto no plano material (poder econômico e político) quanto no plano psicocultural (sentimento de superioridade). (MOORE, 2007, p. 225)

      No bojo destas esferas estruturantes estão: a economia, a educação e a política que, como bem sinalizado pelo autor, estão sob o poder de um segmento social hegemônico. É para manter este status quo, que tal segmento dinamiza as relações sociais e que se articula de tal modo que dificulta uma mudança de realidade. Neste sentido, até mesmo o racismo é visto como algo que inexiste, esta negação se dá a partir do momento em que suas práticas são naturalizadas, dando a enganosa ideia de que não há racismo, pois as coisas são como são e devem continuar assim. Moore (2007, p. 256) diz que:
“As ideologias racistas são abrangentes na medida em que o racismo também é abrangente; na vida cotidiana, ele não aparece mais como um corpo estrangeiro, identificável, chegando a ser fácil negar a sua existência. No seu ponto mais alto de sucesso evolutivo, o racismo, como forma de consciência grupal, não aparece mais como racismo e, até mesmo, se nega como tal. É essa característica de poder se “negar a si mesmo” que lhe confere tal plasticidade e resistência aos esforços de mudança”.

      Observando bem a discussão na USP, podemos ver claramente essa negação da existência racista na fala de um dos alunos da disciplina Micro economia quando diz: “na escola que estudei (particular) também tinha negros, ou, tem “um cursinho de redação aqui na USP para vocês” ou “marquem uma reunião em outro lugar e quem quiser cola lá”. Ou seja, “de que racismo vocês estão falando?”
       Conclui-se então que a luta pela emancipação do "outro", neste caso, do indivíduo negro em uma sociedade baseada na supremacia racial encontra seu algoz, segundo Moore, no Pacto Social constituído por ideologias racistas, que viabiliza a dominação e exploração do outro em uma sociedade multirracial.

A CONSTRUÇÃO DO OUTRO: ORIENTAL PARA OCIDENTAL VER E CRER 
   
      Este olhar sobre o "outro diferente” tem caracterizado as relações humanas ao longo de um grande espaço de tempo. Segundo Moore (2007), não se trata de um caso isolado, ou de uma única origem, o racismo surgiu em lugares distintos e sem conexões diretas. 

Há também outro modo de relação de supremacia de um povo sobre o outro que, como acontece entre leucodérmicos e melanodérmicos (brancos e negros), se baseia na falsa ideia de supremacia de uma raça sobre outra. A diferença é que, esta hegemonia se dá a partir da construção do "outro"por meio de um estudo intencional, permeado de afirmações imperativas, de uma perspectiva unilateral e preconceitos ideológicos, tudo isto para um fim específico, conhecer para dominar e explorar.

       Referimos-nos ao orientalismo, abordado por Edward Said, intelectual que se esmerou em entender as relações entre o Ocidente e o Oriente e identificou como o orientalismo, através de representações da vida oriental, construiu consensos que acabam por legitimar todas as investidas - danosas como são - dos americanos no Oriente Médio. É bom salientar, no entanto, que as investidas de cunho exploratório se dão a partir de uma relação, que segundo Said, fundamenta-se em uma hegemonia complexa que não é apenas algo do acaso, mas planejado, pensado para ser o que exatamente é, vejamos:
O orientalismo, portanto, não é urna fantasia avoada da Europa sobre o Oriente, mas um corpo criado de teoria e prática em que houve por muitas gerações considerável investimento material. O investimento continuado fez do orientalismo, como sistema de conhecimento sobre o Oriente; uma tela aceitável para filtrar o Oriente para a consciência ocidental, assim como esse mesmo investimento multiplicou – na verdade, tornou realmente produtivas – as declarações que proliferaram a partir do Oriente para a cultura geral. (SAID, 1990, p. 18)

       Esta construção do Oriente pelo Ocidente é um esforço continuado, ininterrupto, que não se presta ao trabalho de rever ideias, conceitos, interpretações, mas massifica-se, repetindo suas práticas e suas concepções, como um ciclo de ações onde o "outro" é sempre pormenorizado, passível de dominação e de exploração, cujos dominadores possuem as mesmas características, os mesmos intentos e estão no topo da preeminência política, econômica e social.
       Said (1990) aponta para um longo período de dominação, aliás, o que é mais temido do orientalismo, segundo o autor, é a sua durabilidade, a continuidade de um processo de colonização que vai além da exploração econômica, mas da construção de uma imagem do outro deplorável e desumana que se perpetua e se fixa nas mentes ocidentais geração após geração. Said (idem, p. 14) nos diz que o orientalismo fora criado para fortalecer a própria identidade cultural europeia ao comparar-se com os “inferiores” orientais, ou seja, “o orientalismo é um discurso – a cultura européia ganhou em força e identidade comparando-se com o oriente como uma espécie de identidade substituta, subterrânea, clandestina”. Neste sentido, o outro deve seguir-se como inferiorizado, desprovido de qualquer atributo nobre para que o dominador continue a proclamar e acreditar na sua superioridade.
      A partir deste olhar, podemos analisar a parceria entre Israel e Estados Unidos. Israel então como um departamento ocidental incrustado no Oriente, com um álibi altamente convincente, ou seja, a sua segurança e manutenção do seu Estado localizado em uma área como gostam de propagar “altamente vulnerável e explosiva”, por fazer fronteiras com “países árabes bárbaros” que não se sensibilizam com a população civil, que não se importam com a morte de crianças inocentes e que não conseguem entender o real sentido da “shalom”, situação que os aliados (Israel e EUA) estão a todo o momento propondo. São os “perturbadores de Israel” que devem ser contidos, dominados, colocados em seu devido lugar, ou seja,
(...) se o árabe ocupa bastante a atenção, é como um valor negativo. Ele é visto como um perturbador da vida de Israel e do Ocidente, ou, em outra perspectiva da mesma coisa, como um obstáculo superável à criação de Israel em 1948. Qualquer história que esse árabe tenha é parte da história que lhe é dada (ou retirada: a diferença é pequena) pela tradição orientalista. (SAID, 1997, p. 290

       Vejamos então, como isto acontece na atualidade. Em março de 2015, foram (antecipadamente) realizadas as eleições em Israel. O primeiro Ministro Benjamin Netanyahu, contrariando as pesquisas, surpreendeu e conseguiu se manter no cargo, apesar de, claramente, não receber apoio dos governistas americanos, os democratas.
       O que chama a atenção neste episódio é que, antes da eleição, no dia 3 de março, Netanyahu se dirigiu ao congresso americano, naquele momento, composto quase que inteiramente por republicanos, e chamou a atenção dos políticos para os riscos da aproximação com o Irã e do acordo proposto pelo presidente Barack Obama com o país árabe, com respeito ao enriquecimento de urânio e seu programa de energia atômica. Claro que por detrás dessa visita de Netanyahu estava também a tentativa de nivelar as políticas israelitas e americanas, especialmente com o povo palestino. Políticas estas que recebem críticas constantes do governo americano que, inclusive, sinalizou a diminuição do apoio a Israel, por entender que suas investidas dificultam ainda mais o tão debatido processo de paz na região.
       O presidente norte americano já se mostrou a favor de que, todas as tratativas de negociações de paz na região aconteçam de modo igualitário politicamente, ou seja, que seja reconhecido o Estado Palestino e que os dois Estados negociem suas ações em igualdade de condições. Apesar disto, Netanyahu declarou, horas antes das eleições, que “Os que querem a criação de um Estado palestino e uma retirada [israelense] dos territórios [os assentamentos] abrem o caminho para os ataques de extremistas islamitas contra o Estado de Israel”. Este posicionamento do líder judeu agradou os oposicionistas do governo Obama, foi aplaudido pelos republicanos que acusam seu governo de fraqueza nas relações internacionais.
       Dentre estas “fraquezas internacionais” estão a reaproximação com Cuba, a própria possibilidade de reabertura de negociações com o Irã, travadas desde 1979, as investidas para que seja reconhecido o Estado Palestino como forma viável de estabelecimento da paz naquela região.
       O mundo inteiro acompanha esse posicionamento de Barack Obama com certa estranheza, por se tratar do presidente da maior nação imperialista da terra. O que não é de estranhar é o posicionamento dos seus opositores, que vêem nestas iniciativas uma ameaça à hegemonia americana. Uma hegemonia que segundo Said (1997, p.19) “confere durabilidade e força ao orientalismo”.   Este episódio demonstra com clareza, como a possibilidade de perda desta hegemonia assombra as nações dominadoras. De modo que, a ascensão do outro, o reconhecimento dos seus direitos, o respeito às diferenças que, de alguma maneira contribuiria para diminuir a desigualdade, não interessa aos grupos hegemônicos.
      Sendo assim, para que esta mudança de realidade seja contida, faz-se necessário a insistência na demonização do Outro, na contínua promessa de pacificação (Israel e Palestina) sem a concretização de fato, ou mesmo investidas armadas injustificáveis no único objetivo de conter qualquer tentativa de “virada de mesa”, ou seja:
Um quarto dogma é que o Oriente, no fundo, ou é algo a ser temido (o Perigo Amarelo, as hordas mongóis, os domínios pardos) ou a ser controlado (por meio da pacificação, pesquisa e desenvolvimento, ou ocupação pura e simples sempre que possível). SAID, 1990, p. 305

      Assim, construindo um pensamento aparentemente irrefutável sobre o Outro, segue a ideia de completa dependência de um poder hegemônico para a continuação da sua própria existência como povo e pior do que isso, a perpetuação de um domínio que como já foi dito, ultrapassa a barreira da exploração econômica e reduz um povo tido como “diferente” à condição de inferior.

 CONCLUSÃO

       A manutenção deste status quo, é a grande sacada do orientalismo. Isso explica, por exemplo, a aparente dificuldade de se rever os conceitos construídos, as concepções demonizadas e estereotipadas sobre o Oriente que continuam dando as cartas nas diversas áreas da vida social, desde a política, a economia, a religião, a cultura. Não há aspecto das relações humanas que não estejam impregnadas de preconceitos construídos a partir de uma lógica: a construção do Outro a partir de uma ideia de supremacia. A ideia de que, é a partir de como vejo e interpreto o outro que construo a minha própria imagem.
       A partir da leitura de Moore e Said, concluímos que, tanto negros como orientais serviram de parâmetros para esta construção de superioridade de um povo sobre o outro, considerando negros e orientais como “diferentes”, passíveis de dominação e exploração. Destes foram desconsiderados seu mundo, sua cultura, sua interpretação da vida, seus valores éticos e morais, todas estas coisas perdem valor diante da “superior cultura” de uma determinada “raça”, de uma determinada nação.
       A mudança desse sistema de dominação encravado nas mentes do dominador e também de boa parte dos dominados, consiste em um desafio sem precedentes. Todas as tentativas para a construção de um mundo mais justo e igualitário parecem perder força quando para isso é necessário que o outro lado ceda uma mísera parte dos seus privilégios, mesmo do seu tempo, para ouvir quão diferente são as gentes, no que diz respeito à educação, a condições de vida, economia, acesso à saúde entre outros direitos basilares que, como é sabido, é mais para uns e menos para outros.
       Vimos isto no caso da tentativa de diálogo dos jovens negros na Universidade de São Paulo-USP. Vinte anos tentando dialogar, vinte anos tentando ser ouvidos, e a única maneira de ser notado é subvertendo a ordem. Como condená-los? Como acusá-los de desordeiros? Está ali, em suas mentes, bem vivas, todas as injustiças a eles praticadas, todas as limitações a eles impostas, todo os desrespeitos à sua cultura, à suas vidas. Parem de nos matar! Foi com esta frase que uma das militantes do grupo “Ocupação Preta” começou sua fala naquele dia na sala de aula da USP. Esta é uma verdade desconcertante quando observamos os registros de morte no Brasil. Lá está a maioria negra. É o mesmo que as famílias árabes proclamam cada vez que uma bomba assassina cai em suas casas na calada da noite, matando suas crianças, seus idosos, destruindo seu futuro. Tudo isto em nome de que? De uma hegemonia, de um controle que, para uma maioria de privilegiados deve continuar.
       Fica então a triste constatação de que, segundo os ditames de determinados segmentos humanos, o Outro deve ser controlado para sempre, a sua liberdade total representaria um perigo para as suas pretensões. Representaria a igualdade de poder, de direitos, de realização pessoal. Igualdade na ocupação de funções nos espaços sociais. Uma realidade que os setores hegemônicos farão de tudo para impedir que aconteça. Assim como foi no passado, também é assim no presente. Esperamos que as nossas lutas e processos de conscientização, especialmente a partir de conhecimentos e pesquisas produzam um futuro favorável a todos os humanos, sem distinção.

REFERÊNCIAS

EDITORIAL EL PAÍS.  Duplo Oportunismo: Netanyahu e os republicanos utilizam a negociação com o Irã com fins eleitorais. Disponível em <http://brasil.elpais.com/brasil/2015/03/03/opinion/1425410826_071407.html> Acessado em 03/mai/2015


Jornal do Campus. Movimento negro promove ações para discutir relações raciais na Universidade.Disponível em <http://www.jornaldocampus.usp.br/index.php/2015/04/movimento-negro-promove-acoes-para-discutir-relacoes-raciais-na-universidade/>Acessado em: 02/mai/2015


MOORE, Carlos. Racismo e Sociedade: novas bases epistemológicas para entender o racismo. Belo Horizonte: Mazza, 2007


SAID, Edward W. Orientalismo: O oriente como invenção do Ocidente. São Paulo: Companhia das Letras, 1990

O BRUTAL E DESUMANO UNIVERSO DAS REDES SOCIAIS - Por Maik Oliveira

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